9/14/2006

Capítulo 1

1998 – São Paulo

Samuel acabara de sair do banho. Estava no quarto escolhendo o que vestir. Quase no horário de sair de casa e ir a escola. Pegou uma camiseta preta e uma calça jeans, e calçou seu tênis surrado. Vestiu-se, passou seu desodorante preferido e pegou a mochila. Desceu a escada e trombou com o irmão menor, Flávio. Afagou sua cabeça e sorriu, indo até a cozinha, onde a mãe estava. Chegou de mansinho por trás e a abraçou.
- Tô indo, mama.
- Juízo, hein?
Beijou-a e saiu de casa, cruzando o portão e ganhando a rua. Em menos de quinze minutos de caminhada, estava diante dos portões da escola. Não tinha o habito de ir em turma para a escola, pois aqueles 15 minutos em silencio eram algo que ele prezava muito, mesmo não sabendo o porque.
“Realmente... Por que o silencio me acalma tanto?” se perguntou, adentrando os portões da escola. No pátio principal cumprimentou com a cabeça alguns colegas, virando a esquerda e subindo um lance de escadas. Quando chegou ao primeiro andar, virou a direita e entrou na sua sala de aula, de numero 16. Sala da oitava serie B. Samuel era um garoto de 14 anos, apenas a alguns meses de completar seus tão sonhados 15 anos.
Na sala já estava boa parte da sua turma. Fred, seu melhor amigo e confidente, um jovem rapaz de pele clara e cabelos loiros e sempre desgrenhados. Paulo, leal parceiro das tardes de Mega Drive, além de rival amistoso pelo amor de Clara. A garota era tudo com o que sempre sonhara, uma menina doce que Samuel jurava proteger noite após noite em seus sonhos. E Samuel estava decidido a ter o amor da garota. Havia colocado na cabeça que se declararia para ela até o fim do período de aula.
Após cumprimentar os amigos, Samuel sentou-se em sua cadeira e tirou da mochila seu caderno, e começou a rabiscar alguns versos, como fazia de praxe todos os dias. O assunto era sempre o mesmo: seu amor por Clara. Já idealizara de tantas maneiras diferentes declarar seu amor por ela, mas nunca de fato o tentara. Já estava imerso em pensamentos quando percebeu que era observado. Seu coração bateu mais forte quando seus olhos encontraram os de sua amada, e ela se aproximou dele.
- Tudo bom, Samu?
Samuel estava muito nervoso para esboçar qualquer reação. Tentou ser o mais maduro possível, já que a garota era mais velha do que ele um ano.
- Sim, Clara. T-tudo bom com você?
- Ahn-ham. O que você tanto escreve todos os dias? Posso ver?
Isso fora o bastante para Samuel ir até a Lua um monte de vezes e voltar sem sair do lugar. Sua amada, diante dele, querendo saber o que ele fazia. Sem se dar conta, entregou o caderno à garota.
- Ah, finalmente vou conhecer um dos segredos do misterioso Samu – sorriu Clara, tomando o caderno das mãos do rapaz. Foi então que ele se tocou do que tinha feito. Seus poemas de amor! Clara ia descobrir os sentimentos dele. Mas já era tarde demais para tentar algo, e ele só pode praguejar dentro de si mesmo por ter sido tão bobo e não ter percebido seu erro. O que ele não esperava era a reação da garota
- Nossa, Samu... Estou boba! Você ama tanto assim essa garota dos poemas?
Samuel então lembrou que jamais nomeara seus poemas, sempre escrevendo subjetivamente sobre seu amor. Isso o deixou mais aliviado, mas também um pouco chateado, pois perdera mais uma chance de se declarar para sua amada.
- Sim... Eu a amo demais. Acho que mais do que tudo – sorriu o garoto.
- Acho que você devia contar isso para ela, sabia? Não existe uma garota que não goste de saber que alguém a ama, e sendo você o menino especial que e, não vejo porque ela não namoraria você.
Samuel se sentiu nas nuvens. A garota que ele tanto gostava ali, diante dele, o encorajando a abrir seu coração. Isso foi mais do que ele precisava.
- Entendo... Que tal você me ajudar então, Clá? Eu sou tímido demais... Vamos fazer assim: hoje na saída da escola, eu te deixo em casa, assim no caminho você me dá umas dicas, ok? Fechou?
A garota meneou positivamente a cabeça.
- Pode deixar. Vou te dar uns toques que a farão cair direto nos seus braços.
Clara se levantou, deu um beijo na testa de Samuel e foi para sua carteira. Tão logo ela se distanciou, Pedro aproximou-se e sentou do lado dele, dando um leve soco em seu queixo.
- Ah, moleque... Me passou a perna, hein? Mas era o combinado. Eu ou você, um dos dois a faria feliz... Velho, se você conseguir mesmo, quero ser o padrinho, hein?
Samuel riu do amigo.
- Pode deixar... Vai ser o do casamento e o dos nossos filhos, ok? Hehehe...
E então uma professora entrou na sala. Maria Antonieta, professora de matemática.
- Vamos lá! Cada um em suas carteiras! Prova surpresa de trigonometria.
A sala vaiou em protesto.
- Ah, professora! Ninguém merece!!!
A professora apenas riu.
- É isso ou metade da nota final perdida. Que tal? Gostaram do incentivo?
A sala em silencio arrumou-se para a prova. Samuel ficou um pouco apreensivo, já que nunca gostara de matemática e mesmo se esforçando, sempre passava em cima do muro.
“Putz... Que azar... Pera aí... Azar? Ah, não! Hoje não!”
E afastando os pensamentos ruins da cabeça, começou a copiar os exercícios da prova da lousa.